Dos ratos aos morcegos: tudo o que há para comer no Mercado de Wuhan

Se tem problemas de estômago ou hipersensibilidade, não prossiga com a leitura deste artigo. Fique por aqui. Sem hesitações. A razão prende-se com as imagens do Mercado de Wuhan, na China – e que, recorde-se, tem sido apontado como o epicentro do surto do novo coronavírus (também designado por 2019-nCoV). Os registos fotográficos são aterradores e susceptíveis de causar náuseas e repulsa. Nesta cidade da província de Hubei, e mais do que em qualquer outra parte do mundo, os animais são comercializados ilegalmente à vista de todos, com o intuito de satisfazer a gula dos consumidores locais.

Espécies exóticas são vendidas sem qualquer controlo sanitário. Ainda assim, nada disto parece incomodar os clientes que frequentam o Mercado de Wuhan (ou melhor: que costumavam frequentar, pois Wuhan é, por esta altura, uma cidade fantasma e em regime de quarentena, com todos os espaços, comércio e serviços encerrados). O Mercado deixou de abrir as portas logo no início do ano, aquando da detecção do novo coronavírus.
Recentemente (sobretudo a partir da última semana de Janeiro), intensificou-se a divulgação de imagens e vídeos que mostram como era o dia-a-dia no Mercado de Wuhan, pouco antes de ser fechado pelas autoridades de saúde locais. A massificação deste conteúdo deveu-se, em grande parte, aos utilizadores da Weibo, uma das redes sociais mais populares na China, criada há 11 anos. Em poucas horas, algumas dessas fotos e vídeos chegaram aos meios de comunicação social internacionais. Quase todos eles optaram por difundi-los, acrescentando a advertência: «conteúdo chocante».

Mas, afinal, o que se vende num mercado como o de Wuhan? Tudo. Ou quase. Simplificando: peixe, marisco e carne. A diferença está na diversidade da oferta e do estado em que se encontram os animais (mortos, vivos, feridos ou doentes). Além de galinhas e coelhos (o que não causa qualquer estranheza para o comum ocidental), há cães, cobras, ratos, raposas, porcos-espinhos, burros, ouriços-cacheiros e até macacos. A lista é extensa, o que demonstra bem a procura destas espécies, por parte da população chinesa, para consumo humano.

Através das imagens divulgadas é possível confirmar que muitos dos animais vivos encontram-se em jaulas de dimensão reduzida, partilhando o espaço com outros bastante debilitados ou já mortos. A este acondicionamento tormentoso junta-se a ausência de condições higiénicas: há sangue nas jaulas, nas bancadas onde são preparadas as peças de carne e no chão. Esfolam-se animais à vista desarmada. Pias com água conspurcada servem para “lavar” os mais variados tipos de carne. Ensacam-se pedaços atrás de pedaços, em ritmo acelerado e cadenciado.

Algumas paredes revelam a existência de salpicos ensanguentados. Um dos vídeos ilustra o movimento diário no Mercado de Wuhan, com centenas de pessoas amontoadas por entre os estreitos corredores que ligam as várias bancas de venda. O cliente chega, escolhe, paga e leva. Viva ou morta, cada espécie animal tem o seu preço e não há limites para satisfazer os caprichos gastronómicos. Boa parte da zona do Mercado é imunda, mas nunca há ruptura do stock de animais exóticos comercializados ilegalmente.

Tudo isto é terreno fértil para o surgimento de doenças e uma verdadeira incubadora para os vírus se multiplicarem, evoluírem e contagiarem os seres humanos. Foi, aliás, o próprio director do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças da China a admitir: “a origem do novo coronavírus é a vida selvagem vendida ilegalmente num mercado em Wuhan”.

Ciente de que é preciso pôr um travão no comércio ilegal, o governo chinês afirmou, num comunicado emitido há poucos dias, que “é necessário reforçar a supervisão dos mercados, proibindo e punindo severamente a venda de animais selvagens e exóticos. Temos de controlar os principais riscos para a saúde pública a partir da fonte”.